====== Sofista 257b-258b: O Outro, não ser do Ser, mas não uma negação absoluta ====== Estrangeiro – Consideremos também o seguinte. Teeteto – Que será? Estrangeiro – Sempre que nos referimos ao não-ser, não temos em vista, como parece, o oposto do ser, porém algo diferente. Teeteto – De que jeito? Estrangeiro – Quando falamos de algo não grande, achas que nos referimos mais ao pequeno do que ao igual? Teeteto – Como assim? Estrangeiro – Não podemos concordar que com o emprego da negação indicamos o contrário da coisa enunciada, mas apenas que o Não colocado antes dos nomes que se seguem indica algo diferente das coisas cujos nomes vêm enunciados depois da negação. Teeteto – Perfeitamente. Estrangeiro – Consideremos agora mais este ponto, se estiveres de acordo. Teeteto – Qual será? Estrangeiro – A natureza do outro se me afigura tão partida em pequeninos como seu próprio, conhecimento. Teeteto – De que maneira? Estrangeiro – O conhecimento, também, é uno, porém são separadas as partes relacionadas com determinados objetos e recebem denominações específicas. Daí haver tanta variedade de artes e de conhecimentos. Teeteto – Perfeitamente. Estrangeiro – O mesmo se passa com a natureza do outro, conquanto. seja apenas uma. Teeteto – E possível; porém digamos como se dá tal coisa. Estrangeiro – Não há uma parte do outro que se contrapõe ao belo? Teeteto – Há. Estrangeiro – E diremos que tem nome ou que não tem? Teeteto – Tem; o que sempre designamos como não-belo, que de nada mais diferirá, se não for da natureza do belo. Estrangeiro – Vamos agora responder a mais uma pergunta. Teeteto – Qual será? Estrangeiro – Alguma coisa que foi separado de um dos gêneros dos seres e depois contraposto, em novas conexões, a outro ser; não será isso o não-belo? Teeteto – Exato. Estrangeiro – Logo, ao que parece, o não-belo é a oposição de um ser a outro. Teeteto – Exatíssimo. Estrangeiro – Mas como! De acordo com essa explicação, teremos de aceitar que o belo participa da existência em grau maior, e o não-belo em menor? Teeteto – Em absoluto. Estrangeiro – Sendo assim, precisaremos dizer que tanto existe o não-grande como o grande. Teeteto – Sem dúvida. Estrangeiro – Como teremos de pôr em pé de igualdade o justo e o injusto, para que um não tenha mais existência do que o outro. Teeteto – Como não? Estrangeiro – E o mesmo diremos de tudo o mais, pois a natureza do outro se nos revelou como incluída entre os seres. Ora, se ela existe, suas partes, também, terão de ser consideradas como existentes. Teeteto – Como não? Estrangeiro – Assim, ao que parece, a oposição da natureza de uma parte do outro e da natureza do ser, dada a contraposição das duas, não terá menos existência, se assim posso expressar-me, do que o próprio ser, pois ela não indica absolutamente o contrário do ser, porém algo diferente dele. Teeteto – Sem dúvida nenhuma. Estrangeiro – E que nome lhe daremos? Teeteto – O de não-ser, evidentemente; esse mesmo não-ser à procura do qual andávamos por causa do sofista. Estrangeiro – Então, conforme disseste, em nada ele será inferior aos outros, com relação ao ser, sendo nos lícito afirmar sem vacilações, que o não-ser possui incontestavelmente natureza própria, e assim como o grande era grande e o belo, belo, e também o não-grande, não grande, e o não-belo, não belo: do mesmo modo diremos que o não-ser tanto era como é não-ser, tendo, pois, de ser contado como uma ideia no conjunto dos seres. Ou ainda terás alguma dúvida, Teeteto, a esse respeito? Teeteto – Nenhuma, absolutamente.